Os muros altos, forrados de arame farpado indiciavam o ambiente que ali se vive. Os portões abrem-se, esperando a minha entrada no local de rendenção e penitência das almas. O tempo e as vivências passadas permitiram-me criar, também em mim, muros altos que me defendem e protegem. As revistas, os detectores de metais, o eco (sempre o eco), o frio e a humidade subjacente a estes locais já não me afectam, tornando-se antes uma parte de mim, como uma simbiose.
Aguardo através de uma porta espelhada pelas pessoas que naquela sala, por breves momentos, se irão partilhar comigo. Não deixo de me sentir Caronte, mas num processo inverso, conduzindo neste caso as almas do inferno para uns momentos de paz e liberdade ilusória.
Todos de castanho, com o mesmo semblante frio e soturno, fazem-me pensar na tentativa infrutífera de uniformizar o espírito, mas tal é impossível porque independentemente das experiências somos todos demasiado humanos. Cada sorriso, olhar, aperto de mão são únicos e especiais.
Tento distanciar-me, colocar a máscara do alheamento e simpatia enquanto olho para as grades da janela e penso no que tenho à minha espera no mundo terreno.
Uns olhos negros, frios como metal, inexpressivos e maquiavélicos fitam-me, despindo-me a alma, rasgando-a em mil pedaços. Um esgar de boca deixa entrever dentes aguçados e brancos que me arrepiam de medo e desconforto.
Mãos que se prendem e tocam por instantes num limbo de sinergias onde não existem anjos nem demónios, apenas almas perdidas.
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