quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Caminho Português de Santiago - Dia 4

Dia 20 de Agosto: Redondela - Pontevedra

Antes de iniciarmos a caminhada estava com algum receio deste dia, devido ao que tinha passado no ano transacto, não só por ser um dos percursos mais duros fisicamente, mas também pela carga emocional que lhe estava associada. E foi exactamente essa carga emocional que se abateu sobre mim, levando-me a pensar no passado e a ficar mais nostálgica.
A primeira parte do caminho era bonita e não era especialmente dificil. Em alguns locais via-se o mar e uma paisagem agradável, o que atenuava o que ainda nos esperava.

Passando a PonteSampayo
A partir de certa altura o terreno era extremamente duro, o que fez com que a passada se desenrolasse com dificuldade, o que aliado às dores que já tinha não fez com que o dia fosse leve.
Ao longo do caminho passei pelos locais onde já tinha passado no ano anterior e lembrava-me desses instantes e dos companheiros de viagem, o que me trazia recordações agradáveis. Mas neste dia não, foi diferente. Associei toda a carga negativa que representou este troço do percurso para mim, e o peso emocional que carreguei durante mais de um ano.
E ao passar pelos locais que recordava deixei que uma frase me pautasse o espírito: "a mesma história não se repete de forma igual 2 vezes". E ao passar pelos locais que reconhecia sentia uma vontade enorme de largar o passado, de o sentir longe e resolvido. E senti-me bem com isso.

Percurso na serra


Este dia foi também um dia de despedidas, uma vez que a Chiara decidiu seguir em frente, deixando-nos em Pontevedra. A vida também é assim, feita de pessoas que nos acompanham enquanto tal fizer sentido mas que depois partem, seguindo o seu próprio caminho, que deixou de estar ligado ao nosso. Com o resto dos peregrinos sentados no chão a aguardar que o albergue de Pontevedra abrisse, eu e a Chiara olhámo-nos nos olhos e abraçámo-nos, enquanto íamos falando, ela em Italiano, eu em Português, deixando mais uma vez que a linguagem universal dos afectos e das emoções fluisse. Sabíamos que o nosso percurso conjunto tinha terminado ali e nunca mais nos veríamos, mas já fazíamos parte do percurso de alma uma da outra. Vi a Chiara ir embora, sem olhar para trás, e deixei que o sentimento de tristeza mas resignação me invadisse. Isolei-me, na companhia de um canivete e do meu cajado...

A variável "tempo" e "ciclo" tomaram um peso muito grande. Neste dia dei comigo a pensar nos amigos e na simplicidade das vivências. Recebi mensagens de apoio e foi tão, mas tão importante, sentir que existe alguém que se preocupa, que se lembra, e sentir que faço parte desse mundo e das vivências de alguém. É como se tivesse um dos bens mais preciosos, a Amizade, e nunca a tivesse valorizado devidamente.

Percebi que apesar de um ciclo mais negro que passeio, até nem tenho uma vida má, fui abençoada. E apesar de todos os receios e do caminho que ainda tinha que percorrer, senti-me mais apaziguada, equilibrada, deixando a vida fluir naturalmente.

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